A mulata de ventre oco

Aos 20 anos olhamos para a irregularidade da menstruação com alguma piada; à partida, és sexualmente ativa e tens que te cuidar; chega a ser conveniente não sangrares todos os meses; para ti e para o teu parceiro. Mas o teu corpo reage todos os meses: as dores no baixo ventre, a pressão nas costas, as mamas do tamanho de duas meloas, a fome de uma manada. Quando dás por ti, ainda não fizeste 30 anos e não te lembras quando é que foi a última vez que menstruaste. São ovários policísticos; são quistos; é endometriose. É normal: a tua mãe também teve problemas para engravidar.

Felizmente ou não, o único médico a que me lembro de recorrer com frequência, era o ginecologista porque sempre tive muitas dores menstruais. Aos 14 anos comecei a tomar o pílula, uma fraquinha, diziam eles, para as moderar e para evitar idas ao hospital que julgavas que te iam matar. Curioso é, que aos 35 voltei a tomar as mesmas hormonas mas desta vez porque o meu útero ganhou a forma igual ao de uma mulher de 55 anos ainda eu estava na casa dos 20 anos.

Eliana Silva, autora, comunicadora e fundadora da revista Marcas Por Escrever | DR

Menopausa precoce. Uma mulher que nasce sobre o mito da fertilidade da mulher negra não espera ouvir este diagnóstico assim que põe os pés na casa dos 30 anos. Afinal, não estamos todas prontas para parir pelo nosso ventre? 

A minha maternidade resolveu-se mas o meu útero não voltou a ter 18 anos. Por volta dos 33 anos fiz milhares de exames que confirmaram que a secura da minha pele, a minha irritabilidade, os calores que sentia e a dificuldade em manter um peso saudável eram os primeiros sintomas de uma menopausa. 

Depois de aceitar a velhice do meu ventre com a ajuda dos mais próximos, chegou a hora de me medicar e um ano ou dois depois do diagnóstico voltei a tomar o comprimido diariamente mas desta vez para garantir o meu bem estar (e honestamente, o bem estar dos que me rodeavam). Alguma terapia, milhares de quilómetros percorridos a correr e a pedalar em cima de uma bicicleta, e hoje respeito o meu corpo tal como ele é. Enquanto o ventre é oco e envelhecido, todo o resto se mantém com a energia e a vivacidade de quem não saiu da casa dos 20.