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Não é em vão que a música que marca o percurso dos dois irmãos santomenses é precisamente o "Bomu Kele" - "Acreditar". No maior palco de Portugal, os Calema provaram que acreditar é, de facto, o primeiro passo para conquistar.Minutos antes de António e Fradique Mendes Ferreira subirem ao palco no Estádio da Luz, um dos maiores recintos do país, o público viveu um momento de expectativa palpável. Um countdown no ecrã gigante marcava os segundos finais, com milhares de vozes a acompanharem a contagem em alta voz, numa demonstração clara da ansiedade coletiva que pairava no ar.
A entrada foi à altura do momento histórico. Com um vídeo a anunciar a sua chegada, os dois irmãos surgiram através de um elevador que os fez romper o estádio da Luz para os braços daqueles que tanto esperavam por eles. Vestidos com trajes prateados reluzentes, simbolizando o brilho do momento, os Calema emergiram para fazer história como os primeiros artistas lusófonos a atuarem em nome próprio no maior estádio português."Boa noite, Portugal. Boa noite, Lisboa. Boa noite, lusofonia. Conseguimos! Acabámos de fazer história convosco, todos juntos", proclamaram os artistas, conscientes do marco que estavam a estabelecer para a música em língua portuguesa.
Começaram com "Te Amo", um dos seus grandes sucessos, e logo se percebeu que aquela seria uma noite diferente. O público cantava as músicas de início ao fim, palavra por palavra, numa demonstração de devoção raramente vista em concertos desta dimensão. A plateia era um mosaico de gerações e origens - várias gerações de casais, famílias inteiras, bandeiras de São Tomé e Príncipe, Cabo Verde, Portugal e Guiné-Bissau tremulavam por todo o estádio, ilustrando a capacidade dos Calema de unir a lusofonia através da música.Os irmãos António e Frdique no palco | Fotografias de @Eyeeconic
Nascidos em São João dos Angolares, no sul de São Tomé e Príncipe (António em 1992 e Fradique em 1987), os irmãos que em miúdos só pensavam em "jogar à bola, ir à pesca, brincar", nunca imaginaram que chegariam a este patamar. Mesmo quando iniciaram a carreira, há 15 anos, tal feito não lhes passaria pela cabeça. Hoje, com seis trabalhos de estúdio editados e milhões de visualizações nas plataformas digitais, os Calema são um fenómeno incontornável da música lusófona.
O reconhecimento não tardou a chegar. Vencedores do PLAY de Melhor Grupo por três anos consecutivos (2023, 2024 e 2025), também conquistaram o prémio de Canção do Ano com "Maria Joana", uma colaboração com Mariza que se tornou um hino entre os seus fãs. A sua carreira internacional ganhou impulso após vencerem um festival da canção lusófona em Mutzig, França, país onde viveram antes de se estabelecerem em Portugal.
O concerto no Estádio da Luz foi também uma celebração de amizades e colaborações. João Pedro Pais foi o primeiro convidado a subir ao palco, seguido de Sara Correia, que nos lembrou da importância de parar e respirar com a música "Respirar". Após uma mudança de roupa, os Calema trouxeram Manecas Costa, que colocou o público a vibrar com o "Bulawe", convidando todos a dançar.
Dilsinho, artista fenómeno da música brasileira, apareceu para cantar os seus últimos sucessos, enquanto o público permanecia fiel, acompanhando cada nota. Afinal, não se chega ao Estádio da Luz sem um público que nos é fiel. Seguiu-se a entrada de Dino D'Santiago com batucadeiras, que adicionou mais um sotaque dos PALOP, fazendo o público vibrar e gritar pelos Calema a plenos pulmões.
O francês Tayc trouxe o toque francófono ao espetáculo, seguido de Anselmo Ralph, a quem os Calema prestaram uma sentida homenagem. "Tantos covers fizemos", confessaram os irmãos, antes de interpretarem juntos "Não Me Toca". Bill Lima juntou-se depois para cantarem "Dia Xi Ma Kua Buaru", seguido de um dos momentos mais aguardados da noite: Mariza subiu ao palco para uma interpretação emocionante de "Maria Joana".
A diversidade do público era notável - vários pais com filhas, casais jovens e adultos juntos a cantarem em uníssono, confirmando que os Calema são, de facto, um fenómeno transgeracional. Um momento particularmente emocionante foi o agradecimento dos artistas, quando começaram por falar dos pais e dos avós, estendendo depois o reconhecimento a todos os que os acompanharam - managers, produtores e equipa técnica."Onde Anda Essa Mulher" precedeu o encerramento triunfal com "A Nossa Vez", primeiro na versão original e depois numa versão acústica intimista. A escolha não poderia ser mais simbólica - era, de facto, a vez das ilhas de São Tomé brilharem através do talento destes dois irmãos.Estádio do Sport Lisboa e Benfica acolheu cerca de 30 mil pessoas | Fotografias @Eyeeconic
Para os Calema, este concerto representou mais do que um simples espetáculo. Foi uma homenagem a todos os que antes deles "tentaram e não conseguiram" chegar a um palco desta dimensão. "Este será um concerto histórico não só para nós mas também para toda a Lusofonia", afirmou António em entrevista antes do evento.A produção foi impecável, com tudo pensado ao pormenor, tudo alinhado para que nada falhasse. E não falhou. Desde a cenografia aos efeitos visuais, passando pelo som e pela iluminação, cada elemento contribuiu para criar uma experiência imersiva e inesquecível.
Os Calema não são apenas músicos talentosos, são também agentes de mudança social. Em 2021, fundaram a Associação Bomu Kêlê (que significa "Acreditar"), dedicada à promoção da educação como instrumento de capacitação de crianças e jovens. Recentemente, assinaram um protocolo com a autarquia do Seixal para desenvolverem o projeto Aldeia da Música, um espaço de apoio e mentoria para artistas emergentes.
O concerto no Estádio da Luz foi a consagração de um percurso marcado pela perseverança, talento e uma visão que transcende fronteiras. Os Calema não apenas representam São Tomé e Príncipe no panorama musical global, mas carregam consigo o legado de pioneiros como os África Negra e o Grupo Anguéné, do distrito onde cresceram.
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