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“A imagem do homem negro na televisão ainda é muito marginalizada. Continuamos a fazer papéis muito específicos.” A frase é da atriz Cleonise Malulo, conhecida como Cleo, que interpreta a personagem Aida na novela Alma e Coração, da SIC. A BANTUMEN sentou-se com a atriz para uma conversa informal depois de um encontro inesperado na inauguração do restaurante Three Bones, no coração de Lisboa.
A imagem dos negros representada na televisão continua a ser, muitas vezes, limitada a estereótipos: o empregado, o delinquente, o problemático. Ainda assim, esta realidade tem vindo a mudar com o surgimento de novos talentos lusófonos, determinados em conquistar os ecrãs e todas as plataformas de visibilidade.
As luzes do restaurante brilhavam tanto quanto o sorriso de Cleo. Falou-nos de Angola, onde nasceu há 46 anos, dos seus sonhos, das conquistas e do caminho que percorreu até aqui. Começou como jardineira na Câmara Municipal de Oeiras, foi bailarina no Casino Estoril, dona de uma loja de marroquinaria em Caxias, empregada doméstica, baby-sitter, empregada de restaurante e cantoneira.
O primeiro passo no mundo artístico surgiu nos anos 90, como bailarina, quando deixou Angola, a sua Muxima (coração, em kimbundu), para conhecer o país de Camões. Mais tarde, experimentou a ginástica rítmica e depois o jazz, que a aproximou definitivamente do mundo do entretenimento, mais precisamente da televisão. Seguiram-se castings, muitos nãos e poucos sins.
Alma e Coração é o seu primeiro grande projeto na televisão portuguesa. “É o meu primeiro projeto. Gosto da minha personagem e não podia estar mais satisfeita”, afirmou-nos com emoção. Cleo já tinha participado em pequenas produções, como Paixão (2017), Amor Maior (2016), Depois do Adeus (2013), Windeck (2012), Makamba Hotel e Hora da Lei (ambos de 2008, para a TV Zimbo). Mas associa este momento a anos de dedicação e luta, não só pela profissão, mas também pela cor da sua pele.
Ser mulher negra num espaço mediático maioritariamente branco continua a dificultar o acesso a papéis de destaque. Os papéis secundários, esses, continuam a sobrar. “A imagem do homem negro na televisão ainda é muito marginalizada. Continuamos a fazer papéis muito específicos. Já foi pior, mas ainda falta muito por fazer”, reforça a atriz.
As mudanças, porém, são perceptíveis. A novela A Única Mulher, por exemplo, trouxe uma nova realidade à ficção portuguesa, abrindo espaço a personagens negras com papéis relevantes e complexos. “Há muito talento vindo da diáspora, o que falta são apostas por parte dos canais de televisão”, sublinha Cleonise.
A atriz reconhece também a pressão que existe dentro da própria comunidade negra, desde o público aos atores, para que haja uma representatividade mais sólida e coerente. “Hoje, o negro é gerente, não é só empregado. É médico, advogado, engenheiro… e não podemos continuar a representar sempre os mesmos papéis. Temos de mostrar o que somos de verdade.”
Com este novo papel vêm também o reconhecimento e a fama - algo que Cleonise está ainda a aprender a gerir com humildade. “A humildade abre portas”, diz-nos, enquanto se perde nas fotografias do restaurante que lhe despertam memórias de Angola.
É frequentemente abordada na rua. O público recebe bem o seu trabalho e não se importa de parar para conversar sobre a sua vida, os turbantes que usa ou os próximos episódios da novela. O carinho dos seus pares ainda é tímido - talvez pela falta de atenção dos próprios artistas negros ao seu público ou, como ela sugere, por vergonha. “O público português não tem medo de nos parar na rua e pedir uma foto ou um autógrafo. Sem o público, não existimos. São as pessoas que nos fazem.”
Além de atriz, Cleonise é também coreógrafa no Teatro Maria Vitória, em Lisboa. O futuro não a assusta. Ambas as profissões a preenchem, mas para se sentir verdadeiramente completa, deseja ver uma mudança efetiva. “É importante que haja cada vez mais negros na televisão, nas plataformas, a representar-nos com verdade, com conhecimento e com dignidade”, conclui Cleonise Malulo.
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