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“Foi tudo feito com suor”, e os resultados falam por si. Entrevistámos Nellson Klasszik

23 de Setembro de 2024
“Foi tudo feito com suor”, e os resultados falam por si. Entrevistámos Nellson Klasszik

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Nellson Klasszik é um dos nomes mais sonantes do universo artístico, sendo incomparável dentro da lusofonia quando o assunto é música, vídeos, produção e gestão de carreira. Calema, Anselmo Ralph, Soraia Ramos, Bárbara Bandeira, DAMA, Tony, Mickael e David Carreira, Pérola, Nelson Freitas, Gil Semedo, entre vários outros, são alguns dos artistas com os quais já trabalhou.


A Klasszik, além de produtora, consolidou-se também como agência de talentos e organizadora de eventos. Todo o sucesso que se pode ver hoje é fruto da visão muito clara de alguém que, independentemente de todas as voltas que a vida pudesse dar, sempre soube que queria e iria trabalhar com música.


Nellson nasceu em Portugal na década de 80 e desde cedo mostrou interesse pela arte musical. Não esconde que muito desse entusiasmo se deve aos seus pais: de um lado, o pai que ouvia os clássicos dos cantores cabo-verdianos da época, do outro, uma mãe que ouvia um pouco de tudo, incluindo Julio Iglesias. Groove, como também é conhecido, admite que esse ecletismo foi parte importante no processo de descoberta da música, não só enquanto arte, mas também como veículo de comunicação, mensagem. E di-lo porque ele próprio costumava ir à janela do quarto para “ver” os Black Company. Na década de 80, começava a surgir o movimento hip hop em Portugal, e os Black Company eram um dos grupos pioneiros dessa nova sonoridade que emergia do outro lado do Tejo.

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Lisboa Mistura

Em 1988, apesar de terem uma vida minimamente estável em Portugal, Nellson e a família mudaram-se para a Suíça, naquele que admite ter sido o ponto de viragem na sua vida. Os primeiros tempos não foram fáceis. Diz ter sentido na pele os olhares de quem não estava habituado a ver pessoas negras em certos ambientes. Coincidência ou não, Nellson e a irmã eram os únicos negros da sala. Havia sobre eles um misto de curiosidade e preconceito, ao qual nunca se agarrou. Os pais tinham ido atrás de uma vida melhor para eles e para os filhos; cabia-lhe fazer a sua parte: estudar e formar-se. Acabou por fazê-lo e, ainda que isso estivesse longe de ser o seu sonho, formou-se e tirou o curso de pintor de automóveis. Por essa altura, Nellson, que já tinha cumprido o desejo do pai, preparava-se para então começar a cumprir os seus próprios desejos, e é aí que começam a ser dados os primeiros passos em direção à Klasszik e a toda a estrutura que conhecemos hoje.


Sempre apaixonado por música, comprou um piano em 1992 e, anos mais tarde, em 1995, fundou a New Cap, uma banda que contou com a ajuda de familiares e que lhe permitiu adquirir bases técnicas para o trabalho que viria a desenvolver no futuro. Em 2000, nasceu a discoteca Klasszik e começaram os primeiros contactos com artistas. O conceito era simples: cantar na discoteca e depois passar para o estúdio. Lá, a magia acontecia numa fusão entre talento e a visão de quem sabia exatamente o que queria fazer e onde queria chegar.


Os tempos que viveu na Suíça foram essenciais para formar o produtor, mas foi em França que começou a nascer o empresário. Depois de mais de duas décadas na Suíça, Nellson rumou para França em 2008 e admite ter sido lá que aprendeu tudo sobre negócios.

“Hoje pode ser o começo do fim se só te mexeres na zona de conforto”

Nellson Klasszik

“Começava a ver o pessoal, de manhã à noite, em chamadas, e-mails, business, negócios a serem tratados. Aprendi bastante só a observar as pessoas a trabalhar dentro do estúdio. Quando saí de França, senti que já sabia lançar música, já tinha uma noção das bases para elaborar um produto à volta de uma música.” Nellson pôs rapidamente em prática tudo o que aprendeu sobre negócios e, quando confrontado com a possibilidade de ir para os Estados Unidos, questionou-se até que ponto não seria melhor investir o tempo na criação da sua própria marca. 


O resultado chegou em 2009, quando começou a preparar o projeto “Say you’ll be mine” com a cantora Márcia, a primeira artista da produtora. Estava dado o pontapé de saída: a Klasszik surgia enquanto produtora com o propósito e missão de “montar uma estrutura unida pela língua portuguesa, forte o suficiente para exportar talentos”. Mas é mais fácil perceber o impacto que Nellson tem no universo musical de uma forma muito rápida: cantarolando "então agora não me toca..". Há um antes e um depois de Anselmo Ralph. Tudo mudou no mercado a partir daí, era impossível contrariar o YouTube, os números estavam lá. Milhões de visualizações confirmavam que, em Portugal (tal como aconteceu nos PALOP), estávamos perante um sucesso viral, com as principais rádios, festivais, telenovelas, cinema, a validarem o trabalho de Nellson.


O tema "A Nossa Vez", dos Calema, o primeiro a ultrapassar a barreira dos 100 milhões de uma música cantada em português (sem ser do Brasil), marcou uma mudança significativa. Em 2024, a dupla esgotou duas vezes o Altice Arena, num ano em que a banda bate o recorde de datas portuguesas e internacionais.

“Foi tudo feito com suor”, e os resultados falam por si. Entrevistámos Nellson Klasszik

Nelson Klasszik | DR 

Como referido no início, a Klasszik é a produtora por trás dos lançamentos musicais de artistas como Anselmo Ralph, Nelson Freitas, Calema, Soraia Ramos, Bárbara Bandeira, Tony Carreira, David Carreira, Mickael Carreira, DAMA, Áurea e Mariza. Embora todo este sucesso seja fruto de muito trabalho, Nellson não esconde que deveria haver mais abertura por parte do mainstream português para com os artistas PALOP. “Não valorizam”, admite, acrescentando que, no caso de Anselmo Ralph, foi preciso comprovar que o artista era muito conhecido em Angola para que pudesse tocar numa rádio nacional. Considera, contudo, que o mercado é organizado o suficiente para permitir que alguns artistas possam viver exclusivamente do seu trabalho. Para os artistas PALOP, essa realidade também existe, mas, até lá chegarem, é preciso contornar a situação com aquilo que Groove chama de “códigos”. “Se queres entrar no mercado português, tens que usar os códigos desse mercado, não basta só cantar”, afirma. Por códigos, entende-se tudo o que faça o mainstream identificar-se a ponto de parar para ouvir: a língua, o acorde de um instrumento musical característico do país, o local escolhido para gravar o videoclipe, tudo o que vai além da música e que permite ao ouvinte relacionar-se de outra forma com quem canta.


Talvez a sua melhor característica, e que define toda a sua postura perante a arte, seja a sua capacidade única de detectar, formar e potenciar talento, sejam eles produtores, compositores, estilistas, realizadores, editores, entre outros. É essa visão e essência que coloca em tudo o que faz. Admite que sempre foi exigente com os outros e consigo próprio. A estrutura que tem hoje é prova disso: a Klasszik conta com mais de 20 colaboradores distribuídos por diversas áreas e opera num espaço que é propriedade total da produtora. A junção entre sucesso e visão de negócio é, talvez, a premissa que justifica os números impressionantes da Klasszik: mais de 1 124 milhões de visualizações no canal de YouTube, fora outras plataformas de streaming. Com provas dadas em território nacional, Groove aponta para o local onde conheceu toda a cultura e musicalidade afro, que continuam a servir de inspiração para o trabalho que faz hoje: Angola. Foi lá que, entre idas e vindas, descobriu o potencial da música afro. E é lá que pretende abrir a Klasszik Angola. De momento, só tem o edifício; falta a montagem do estúdio e dos equipamentos. Desengane-se quem pensa que é acaso ou sorte. “Foi tudo feito com suor e paixão”, admite.


No crescimento da Klasszik e na consagração de Nellson como uma das 100 pessoas mais influentes da Lusofonia, destaca-se a visão de quem sabe que “hoje pode ser o começo do fim se só te mexeres na zona de conforto”. E isso explica muita coisa.

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