Casa do Comum recebe nova edição do MIA, sob o olhar curatorial de Ivanova Araújo

1 de Novembro de 2025
ivanova araujo entrevista mia
Ivanova Araújo na inauguração do MIA 2023 | Foto ©BANTUMEN

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O MIA – Mês da Identidade Africana regressa a Lisboa para a sua 4.ª edição, entre 5 e 15 de novembro, na Casa do Comum, com uma programação gratuita que celebra arte, cinema, literatura, infância e música. A mostra inaugural, “Ecos da Memória”, com curadoria de Ivanova Araújo, estará patente de 5 a 15 de novembro, às 18h30, e reúne os artistas Naia Sousa (Moçambique), Sai Rodrigues (Cabo Verde), Gigi Origo (França/Cabo Verde) e Ricardo Parker (Portugal/Cabo Verde). A exposição propõe um olhar sobre a história como um eco vivo e transformador, assinalando os 50 anos das independências dos PALOP, e contará ainda com performances de Sani Dubois (Chão que Vibra, Corpo que Responde) e Cynthia Perez (Versos de Liberdade).

Curadora desta edição, Ivanova Araújo pontua em entrevista à BANTUMEN que “o MIA é um evento importante, não só importante, como necessário. É um palco onde há espaço para os diferentes artistas dos PALOP, onde se dá visibilidade e se exalta o que se produz cá, mostrando que existimos e temos uma história para contar.”

Nascida em Angola e criada em Odivelas, desde cedo percebeu que a arte, mais do que estética, é um ato de transformação. “Acredito que uma simples pincelada pode mudar um ponto de vista, despertar consciências e até provocar movimento social ou político”, afirma. A sua relação com área é visceral e atravessada pela consciência do poder que as imagens têm para provocar reflexão e mudança, algo que estende, invariavelmente, à arte africana, que sempre fez parte do seu quotidiano. Para a curadora, poder estudar e trabalhar com artistas africanos é “um ato de identidade e de pertença” e estabelecer diálogos entre criadores africanos e afrodescendentes, dentro e fora do continente, é uma forma de reafirmar raízes e dar visibilidade a expressões culturais muitas vezes silenciadas.

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MIA MIA 2025

“Acredito que uma simples pincelada pode mudar um ponto de vista, despertar consciências e até provocar movimento social ou político”

Ivanova Araújo

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Ivanova Araújo | DR

O processo criativo, explica, é tão intuitivo quanto disciplinado e parte de uma construção que entende a curadoria como algo sensorial, feito de escuta e olhar. “Nunca é algo linear. Eu penso, estruturo a exposição e a montagem, mas acaba sempre por ser como as coisas fluem no dia. Esse é o momento decisivo, porque no papel nem sempre é o mesmo que na parede. No fim, sigo o que os olhos me dizem no momento, o que fica visualmente apelativo para transmitir a mensagem que se quer.”

Licenciada em História, percebeu que o mestrado na mesma área não seria o caminho certo. “Perguntei-me o que mais me apaixonava, além da História e dos livros, e a resposta foi óbvia: Arte.” Sem formação formal na área, confiou no instinto e no autodidatismo para mudar de rota. Ingressou em Museologia e Museografia na Faculdade de Belas-Artes e, mais tarde, aprofundou o olhar com um mestrado em Crítica de Arte, Curadoria e Teorias da Arte.

Entre páginas e pigmentos, descobriu nos livros uma extensão da sua curiosidade. Viaja sem sair do lugar e encontra em cada leitura novas formas de compreender o mundo. Perfeccionista incurável e movida pela curiosidade e por um bom desafio, moldou o seu percurso entre o rigor histórico e a liberdade criativa. A paixão pela História nasceu nas aulas de uma professora que falava das civilizações “como quem recorda velhos amigos”. Foi essa abordagem viva que a levou a querer investigar cada detalhe do passado. Ainda em criança, recorda-se das tardes em frente à RTP2, a ver desenhos animados sobre as invenções dos grandes pintores europeus: o primeiro contacto inconsciente com o fascínio pelas artes visuais. Mais tarde, no ensino secundário, o estudo do movimento impressionista reacendeu esse interesse e levou-a a mergulhar por conta própria nas histórias e técnicas dos artistas que mudaram a forma de ver o mundo.

“A importância de fazer estas curadorias é que são algo de nós para nós. Claro que está aberto ao público em geral, mas poder explorar a minha criatividade ao contar a história dos artistas e criar conexão com o público que as vê é algo inexplicável”

Ivanova Araújo

A jornada profissional começou na Mostra Art Galeria, onde iniciou como assistente de curadoria e, mais tarde, assumiu a responsabilidade de curar a primeira exposição individual da artista Piera Moreau. A experiência marcou-lhe o percurso e ensinou-lhe que “a arte é um diálogo entre quem cria, quem observa e quem interpreta”.


A ligação à BANTUMEN, viria tempos depois, em 2016, com a exposição FragMENTES, que reuniu Piera Moreau e Indi Nunez. Em 2023, essa parceria evoluiu para um dos momentos mais marcantes da sua carreira: a materialização do MIA - Mês da Identidade Africana, que passou de um projeto editorial digital para um evento físico, tornando-se um espaço de celebração da identidade negra e da diversidade artística africana, trabalho a que reconhece uma dimensão pessoal e simbólica. “A importância de fazer estas curadorias é que são algo de nós para nós. Claro que está aberto ao público em geral, mas poder explorar a minha criatividade ao contar a história dos artistas através das suas obras, que nos são tão familiares, e criar conexão com o público que as vê é algo inexplicável.”


Na voz e no olhar de Ivanova Araújo, curar é reconstruir narrativas e devolver sentido a histórias que durante décadas foram contadas a partir de um único ponto de vista. O MIA – Mês da Identidade Africana nasce desse impulso de reequilíbrio e de uma vontade de inscrever a criação africana num espaço de legitimidade e reflexão. Entre o arquivo e o presente, a curadora desenha um percurso que une artistas, públicos e memórias, onde a arte se impõe como lugar de escuta, crítica e reconstrução.

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