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No coração de Bissau, entre ruas de terra batida e o eco de martelos sobre madeira, encontrámos Mamadu Conté, na Feira de Artesanato da Guiné-Bissau. Artista plástico e presidente da Associação Nacional de Produtores e Promotores de Arte da Guiné-Bissau, Conté tem mais de três décadas de experiência em artesanato, sendo considerado uma figura central na luta pela valorização e organização do setor no país.
O percurso na área começou em 1994, na Pensão Central, “ao lado de uma varanda de rosa e rosa”. Lá aprendeu os primeiros traços da arte, com a orientação do primo Lamine Conté, que regressara do Senegal com a sabedoria das mãos. Antes disso, foi marinheiro, profissão que deixou sem saudades: “esta foi a minha escolha. Eu achei que valesse a pena começar a fazer este trabalho. Para mim, é uma coisa boa, uma coisa boa para aproveitar o meu dia-a-dia”.
À primeira vista, o espaço de trabalho de Mamadu pode parecer improvisado, mas entre esculturas em madeira, cabaços esculpidos e animais moldados em pedra-sabão, há um cuidado preciso na forma como as peças são expostas, cada uma carregando fragmentos da história e da identidade guineense. “Para fazer uma peça leva muito tempo, porque nós trabalhamos só com a mão. Ninguém trabalha com a máquina. A mão é mais representativa do que a máquina. A máquina é artificial”, afirmou com orgulho.
Líder da associação de artesãos há 14 anos, Mamadu mantém-se ativo na defesa dos seus membros e na mediação com o governo, fazendo muitas vezes o papel de ponte. Quando surgem problemas, é ele quem dá a cara para tentar negociar e encontrar um ponto de equilíbrio. A associação surgiu da necessidade de fortalecer o setor artesanal face à instabilidade do país, que afasta o turismo e reduz drasticamente as visitas. Sem apoio estruturado, os artesãos uniram esforços para garantir alguma estabilidade e continuidade ao ofício.
Com o agravamento da crise social, a associação assumiu também um papel de intervenção comunitária, oferecendo o artesanato como alternativa à emigração clandestina. Através da formação e integração de jovens, o coletivo procura combater o desemprego e promover oportunidades dentro do país. A formação de novos artesãos, contudo, continua a ser um desafio: “Fazemos isto para travar a emigração clandestina por terra ou pelo mar. Agarramos este trabalho para conquistar outros jovens dos bairros, para se juntarem a nós e podermos avançar. Este trabalho é muito difícil. Tem pouca adesão em termos de aprendizagem. Muitos escultores abandonam porque não tem muita saída” explicou Conté.
Apesar dos anos de dedicação, Mamadu Conté conta que nunca teve oportunidade de levar as suas obras para uma exposição internacional, nem teve contactos com galerias ou instituições no estrangeiro. “Ainda não tenho nenhum contato com estrangeiros, a nível da associação ou pessoal. Só trato com clientes que vêm. Nunca tratamos com pessoas que vão permitir algo sobre a arte da Guiné-Bissau no mundo fora”. Ainda assim, mantém vivo o objectivo de levar o artesanato guineense além-fronteiras. A falta de visibilidade e de condições para participar em exposições internacionais continua a ser um entrave à valorização do trabalho local, com a ausência de apoio estatal a agravar o cenário. Sem financiamento, infraestruturas ou incentivos, a atividade artesanal sobrevive apenas graças ao esforço coletivo dos associados, que, mesmo assim, não conseguem responder às necessidades do sector.
Em contraste com colegas de países vizinhos da União Económica e Monetária da África Ocidental (UEMOA), que têm acesso a crédito e participação em feiras, os artesãos guineenses continuam a trabalhar com os poucos recursos disponíveis, reinventando-se todos os dias para manter viva uma arte que resiste, dentro e fora do país. “Nós falamos qualquer língua, mal falada, para conseguir capturar alguma moeda na mão dos clientes. Chinês, russo, polaco… o que for”, conclui Mamadu.
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