Movimento Street Art, um reflexo da arte de rua em Moçambique

5 de Agosto de 2025
Movimento Street Art Moçambique
AfroIvan, fundador do Movimento Street Art | DR

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O artista moçambicano AfroIvan está a percorrer os Estados Unidos numa viagem que alia exploração artística a pesquisa de campo, ao serviço de um coletivo que, há mais de uma década, reivindica a rua como palco legítimo para a criação. Fundador do Movimento Street Art, considerado um dos mais influentes no panorama da arte urbana em Moçambique, leva consigo, além de murais e tintas, uma visão profundamente comprometida com a democratização cultural e com a transformação social através da estética.

Criado em 2012, o Movimento nasceu da vontade de afirmar a arte urbana como linguagem autónoma e acessível, garantindo visibilidade a artistas afastados dos circuitos institucionais e das grandes galerias. Assumindo a cidade como tela, o coletivo propõe um encontro direto entre criadores e público, resgatando os espaços cinzentos da urbe e das periferias. “Permite que todas as pessoas possam ter contacto com as obras e visitar as exposições, para além de resgatar os espaços cinzentos da cidade e periferia”, explicam.

A génese do projeto está ligada a uma inquietação pessoal de AfroIvan, que identificou a ausência de lugares de expressão livre como um vazio a preencher. “Queria criar algo mais direto, acessível e que fizesse realmente parte do dia a dia das pessoas. A arte na rua tem uma capacidade única de chegar ao público de forma espontânea, sem barreiras de entrada”, afirma. A ambição não se ficou por Maputo: a cidade da Beira tornou-se um novo polo de intervenção, em colaboração com artistas como Hotélio, Ferraz e Isaac Newton.

Na Beira, a segunda maior cidade do país, a arte muralista tem ganho fôlego desde 2022. Ali, os murais não funcionam apenas como elementos decorativos, mas como reflexos vívidos da realidade local. “A Beira está a tornar-se um verdadeiro polo criativo, onde a arte urbana se conecta com as vivências locais, ao mesmo tempo que dialoga com tendências globais”, observa AfroIvan. Para o artista, cada intervenção no espaço público assume-se como resposta simbólica ao contexto vivido, funcionando como instrumento de resistência, de denúncia ou de questionamento coletivo. A influência do bairro Unidade 7, onde cresceu, e o envolvimento no projeto artístico e musical Monkey Volution, moldaram-lhe esse compromisso com o cruzamento de linguagens e com a crítica social.



A par da criação artística, o coletivo dinamiza sessões formativas e oficinas com crianças, visitas guiadas destinadas a turistas e entusiastas da street art, e publicou a obra Maputo Street Art, editada pela Ethale Publishing, que documenta a evolução e impacto do movimento na paisagem urbana da capital.

Neste momento, AfroIvan encontra-se nos Estados Unidos, numa missão de intercâmbio e observação. “Estou a procurar novas colaborações com artistas urbanos, a estabelecer pontes com organizações de arte pública internacionais e a aprender como o movimento de arte urbana se estrutura em diferentes partes do mundo”, partilha. Lisboa foi também uma das paragens recentes do artista, onde participou em mesas-redondas sobre arte urbana e transformação social, e integrou visitas organizadas pelo Lisboa Street Art Tours, numa tentativa de fortalecer o turismo criativo em Maputo, inspirado nas boas práticas da capital portuguesa. “Foi uma experiência muito enriquecedora, tanto visualmente como em termos de conexões. Tivemos conversas importantes sobre possíveis colaborações, o que faz muito sentido, considerando que Moçambique e Portugal partilham uma longa e complexa história colonial, bem como laços culturais e políticos profundos.”

Apesar da crescente valorização da arte urbana em Moçambique, AfroIvan não ignora o desnível face a contextos como o norte-americano. “Lá, a arte urbana floresce com financiamento, curadorias e museus especializados. Em Maputo, nasce da urgência, da necessidade, da resposta imediata ao que se vive”, sublinha. A ausência de apoios estruturados contrasta com a espontaneidade e a força expressiva do que se cria nas ruas moçambicanas.

É nesse espírito de resistência e reinvenção que está a ser preparado o próximo festival de street art, previsto para dezembro. O evento será um espaço de celebração e reflexão, onde se discutem temas como ambiente, futuro, inclusão, género e identidade, envolvendo diretamente comunidades locais. “Vamos contar com artistas de diferentes províncias moçambicanas e também convidados de fora, como do Quénia, Colômbia, Ilha da Reunião e mais alguns por confirmar. A ideia é que cada mural, cada performance, seja também um diálogo entre territórios e linguagens”, adianta AfroIvan.

Este ano, o festival terá uma ênfase especial na presença feminina, destacando o papel das mulheres que integram o coletivo e outras iniciativas artísticas. “Vamos refletir sobre como as narrativas da arte urbana têm vindo a quebrar a tradição da arte pública, especialmente dos murais, historicamente muito dominados por homens”, conclui.

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