Ângela Brito apresenta “Pangeia” na SPFW 2025, ao som de Funaná, ancestralidade e contemporaneidade

October 27, 2025
Ângela Brito São Paulo Fashion Week
© Guilherme W. Trajano

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A estilista cabo-verdiana Ângela Brito abriu a São Paulo Fashion Week no dia 19 de outubro de 2025 com a coleção Pangeia, apresentada no Centro Cultural de São Paulo. O trabalho, desenhado pela própria, contou com a colaboração do stylist brasileiro Maika Mano, com quem já tinha trabalhado há cinco anos, e parte da ideia de reunião e de retorno inspirada na Pangeia, o supercontinente que existiu há milhões de anos. “A Ângela é uma designer que pensa a moda de uma forma muito profunda, que é uma coisa que eu também faço. Ela pensa em peças, não em looks. Isso para um stylist é um prato cheio para criar”, afirmou Maika.

Em entrevista à BANTUMEN, a designer admitiu sentir  “que temos uma cicatriz até hoje, de quando éramos unidos. Não acredito que a gente seja separado. Tenho a sensação que todos estamos conectados e unidos, e a separação é só uma ilusão. Para mim isso é Pangeia, uma reunião para um lugar onde a gente sente falta. A gente se lembra e acha que existiu em algum momento.”

Primeira estilista negra a estrear na São Paulo Fashion Week, em 2019, Ângela Brito nasceu na ilha de Santiago, em Cabo Verde, no interior de Santa Catarina, onde viveu até aos dez anos antes de emigrar para Portugal. Em 1994 mudou-se para o Brasil para estudar Engenharia de Telecomunicações, área em que trabalhou durante vários anos, mantendo sempre a moda como presença constante na sua vida. Desde criança se interessava por tecidos e cortes, influenciada pelas referências familiares, e recorda que passava horas a desenhar roupas enquanto outras crianças brincavam na rua. Em 2014, sentindo-se preparada para uma transição de carreira e com o desejo de transformar o seu olhar em criação autoral, fundou a Ângela Brito Brand, uma marca que conquistou espaço e reconhecimento no panorama da moda afro-brasileira, vestindo nomes como Camila Pitanga, Zezé Motta, Taís Araújo, Maju Coutinho, Flávia Oliveira, Luedji Luna, Mayra Andrade, Luiza Brasil, Paulinho Lessa e Jéssica Ellen.

“Quando eu cheguei no Brasil [1994], a SPFW nem existia. Estão comemorando 30 anos e eu estou aqui há 31. Então eu realmente acompanhei toda a trajetória da moda brasileira. Eu não via ninguém como eu em lugar nenhum, a não ser uma ou outra na passarela. A gente está vivendo esse momento agora de maior diversidade, de maior inclusão, mostrando o nosso trabalho, conquistando respeito. Para mim é extremamente especial. Eu sempre achei que precisava, só tenho que agradecer a Deus e comemorar.”

A tradição, a forma de viver e de pensar, bem como a expressão da africanidade, atravessam cada criação da marca, que faz da moda um espaço de afirmação cultural e identidade. Ângela procura afastar-se do estereótipo da “moda africana” frequentemente associado à diáspora, incorporando elementos como cortes assimétricos, tecidos de textura delicada, o uso do panu di terra e os lenços inspirados no interior da ilha de Santiago.


 ©Guilherme W. Trajano


O resultado é uma linguagem estética que conjuga ancestralidade e contemporaneidade, refletindo a mulher que é e o universo que representa. “Moda para mim é comportamento, é pesquisa, é refletir o seu tempo, mas também é construção de roupa. Não podemos negligenciar isso. A roupa precisa ser sim bonita, mas não necessariamente, porque a beleza é relativa, então não é uma coisa que eu me fixo muito. Fico muito lisonjeada que as pessoas achem bonito, mas esse não é o propósito. A roupa precisa ser funcional, utilitária, corresponder ao seu dia a dia, precisa te auxiliar. A moda precisa estar ali para somar e não para separar ou dificultar. Quando crio uma peça, entendo o dia a dia da mulher e do homem para quem estou criando, o que fazem, como pensam. Porque eu sou essa mulher. Quero criar mulheres como eu, não necessariamente com o mesmo estilo, mas que tenham as mesmas ideologias, para se conectar com a minha marca. Nós somos contemporâneos, sempre fomos, depende de e para onde você está olhando.”

O desfile contou com a presença do cantor Dino d’Santiago, filho de pais cabo-verdianos nascido em Portugal, e da cantora Kady, natural da cidade da Praia, em Santiago, que participou pela primeira vez como modelo na SPFW, desfilando para a Ângela Brito. Dino d’Santiago afirmou que “de repente, estás na SPFW não só na roupa, mas na oralidade e na música. Ver 39 modelos a representar o nosso traje, sentir a nossa tradição, o futurismo, e a presença de uma estilista que já ocupou o seu espaço com todo o mérito aqui no Brasil. Espero que, lá do outro lado do oceano, que Cabo Verde veja a Ângela Brito como um símbolo nacional, cultural, que precisa ser bem divulgado na nossa cultura.”

Kady, intérprete do single Emorio, destacou o significado do momento ao afirmar que “foi uma grande honra ter participado do desfile da Ângela Brito. Sendo ela a pioneira, a primeira mulher estilista negra a fazer parte desse evento tão conceituado, isso representa ainda mais. Pangeia e todas as outras coleções da Ângela são de uma criatividade e simplicidade exuberantes. Além disso, desfilar ao som da música e da voz potente do Dino d’Santiago, sentir um Funaná num mundo que não é comum, é resistência e traz esperança. Para mim foi celebração da nossa identidade e cabo-verdianidade, nossa africanidade.”

A atriz Letícia Colin também marcou presença no desfile, a convite de Maika Mano, e referiu que “a Ângela é uma figura fundamental para o nosso país, para a moda daqui e pro mundo. Quando alguém consegue ser muito autêntico e reconectar totalmente com a ancestralidade e com a origem, coloca isso de uma maneira tão natural e uma roupa que eu usaria no dia a dia. Uma roupa muito simples e que contém toda uma história. Acho uma combinação do complexo com algo muito elegante e simples. Sou muito fã da Ângela e estou muito feliz de estar aqui.”

A apresentação de Pangeia reforçou a relevância da marca no cenário internacional e consolidou o percurso de Ângela Brito como uma das vozes da moda afro-lusófona contemporânea.

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Universal // C4 Pedro Ancestralidade
Ângela Brito São Paulo Fashion Week

 ©Guilherme W. Trajano

Ângela Brito São Paulo Fashion Week

 Kady | ©Guilherme W. Trajano

Ângela Brito São Paulo Fashion Week

Dino d’Santiago I©Guilherme W. Trajano

Ângela Brito São Paulo Fashion Week

 ©Guilherme W. Trajano

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