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A Associação Saúde das Mães Negras e Racializadas em Portugal divulgou, a 3 de novembro, o manifesto “Até quando?”, um texto de denúncia e apelo à responsabilidade do Estado perante as mortes recentes de uma mulher e da sua filha no Hospital Amadora-Sintra. O documento, tornado público após o caso de Umo Cani, questiona a inércia governamental face a uma crise que, segundo a associação, “tem nome, cor e responsáveis”.
“Até quando mulheres e crianças irão morrer nas maternidades portuguesas? Até quando mulheres negras irão sofrer com o racismo institucional?”, lê-se nas primeiras linhas do manifesto, que traduz a revolta perante um sistema de saúde que consideram desigual e excludente. O texto acusa o Estado de “negligência estrutural” e de perpetuar práticas que colocam vidas em risco, ao não garantir condições adequadas de segurança e acompanhamento clínico durante a gravidez e o parto.
O caso de Umo Cani, mulher guineense de 36 anos que morreu no Hospital Amadora-Sintra juntamente com a bebé que esperava, tornou-se símbolo dessa denúncia. A ministra da Saúde, Ana Paula Martins, afirmou no Parlamento que a grávida “não teve acompanhamento até à data em que entrou pela primeira vez no hospital, já com 38 semanas”, associando a tragédia a “situações de mulheres recém-chegadas a Portugal, sem médico de família e sem acesso regular ao sistema”. Questionada sobre eventuais responsabilidades políticas, a ministra rejeitou a demissão.
Poucos dias depois, a família da vítima apresentou documentos que desmentem a versão oficial, revelando que a utente era residente legal em Portugal desde 2024, estava inscrita no Centro de Saúde de Agualva e vinha a ser acompanhada pelo Serviço Nacional de Saúde desde julho, com consultas de rotina e encaminhamento para obstetrícia devido a risco elevado. A Unidade Local de Saúde Amadora-Sintra acabou por admitir que a informação inicial estava incorreta, justificando a falha com a ausência de um sistema clínico integrado.
Para a associação, este episódio é a face mais visível de um problema estrutural. “Estamos cansadas de sermos mal tratadas; estamos com medo de ficarmos grávidas; estamos apavoradas com tanta irresponsabilidade”, lê-se no manifesto, que reflete o sentimento de insegurança partilhado por muitas mulheres negras e migrantes em Portugal. O texto lamenta “a insensibilidade e o racismo” da atual administração da Saúde, ao mesmo tempo que alerta para o impacto de novas medidas orçamentais.
O “Até quando?” surge num momento de forte pressão sobre o Serviço Nacional de Saúde (SNS), marcado por encerramentos pontuais de maternidades, falta de profissionais e sobrecarga nos serviços de obstetrícia. O documento critica as opções inscritas no Orçamento do Estado para 2026, que prevê cortes superiores a 200 milhões de euros em medicamentos, material clínico e exames, bem como uma política de “contratações zero” no próximo ano.
“Se uma das razões para as maternidades fecharem dia sim, dia não, é a ausência de profissionais, com esses cortes, a situação que já é caótica tornar-se-á insustentável”, adverte a associação, que apela à mobilização civil e institucional para travar o agravamento da crise.
O manifesto termina com um apelo direto à ação onde refere que “não podemos calar. Não podemos aceitar que a morte se torne rotina. É tempo de exigir um Estado que cuide, repare e transforme. Antes que mais uma mulher se torne um número e mais uma criança, ausência.”
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