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A música nasce, cresce, renasce, e reinventa-se com o passar das décadas. E com essas alterações surgem novos cantores, vozes que fazem calar, vozes que fazem chorar ou vozes que nos remetem a certos lugares e momentos.
As ilhas que fizeram da cachupa um dos maiores pratos do mundo, Cabo-Verde, é também, o berço das melhores vozes da lusofonia. A sua cultura e o sorriso da suas gentes transmitem esperança, amor, e felicidade. E é isso mesmo que se sente ao ouvirmos as músicas que nos entram em casa, directamente das ilhas de Barlavento e Sotavento.
Cremilda Medina é um entrosamento harmonioso entre as músicas cantadas por Cesária Évora, Ildo Lobo e Tito Paris. A sua querida morna – rainha dos estilos musicais da Música Tradicional de Cabo-Verde – é a sua estrela guia, que lhe oferece o sol e faz a composição certa da sua vida.
Como a diva dos pés descalços uma vez cantou, “Deus tá leva-no sempre assim. Na Paz, amor e carinho” (em tradução livre, Deus que nos leves sempre assim. Na Paz, amor e carinho). Cremilda segue essa premissa, com humildade e com amor pelo que a move, a Morna e a Coladeira.
A BANTUMEN quis descobrir um pouco mais sobre essa nova brisa que delicia Cabo-Verde com a sua doce voz, a voz da cultura e do povo. Abaixo, podes ler a entrevista em exclusivo à artista que faz parte de uma nova geração de músicos, a menina de Mindelo, Cabo-Verde, Cremilda Medina.
A Cremilda é uma menina nascida em Mindelo, na ilha de São Vicente, em Cabo Verde, no seio de uma família humilde e sem ligação à música mas que desde pequenina sempre teve a música em casa através da rádio que os pais ouviam com muita frequência.
Cresceu em São vicente e só depois de ter terminado o ensino secundário foi para a Praia onde continuou os estudos e terminou o curso profissional de Secretariado Executivo.
Desde cedo que começou a cantar em alguns eventos na escola e, mais tarde, em algumas bandas em Mindelo o que fez com que o gosto pela musica fosse crescendo, o que a levou a querer fazer uma carreia no mundo da música.
Não foi fácil chegar a este nome, por tudo o que ele representa. Pensámos em outros nomes mas nenhum me dizia alguma coisa de especial, até que surgiu a hipótese de Folclore.
Sendo que Folclore simboliza a cultura popular, assim como a identidade de um povo, não haveria melhor nome para definir o meu primeiro trabalho discográfico, pois é isso mesmo que eu pretendo. Trazer a nossa cultura popular através da nossa identidade na morna e na coladeira e transmiti-la às gerações mais novas.
2016 foi um marco importante nesta caminhada. As pessoas perguntavam onde podiam encontrar as minhas músicas, um álbum meu e eu ainda não tinha nada gravado, a não ser uns vídeos gravados ao vivo que estavam publicados na Internet. Assim, senti a necessidade de ter algo mais também para dar uma resposta às pessoas que tanto carinho me deram desde sempre.
Foi assim que surgiu o primeiro single, “Raio de Sol”, uma morna que serviu também para perceber e sentir a aceitação por parte das pessoas.
A aceitação foi muito boa, tive críticas muito boas, o single mereceu nomeações para prémios nacionais e internacionais. Foi lindo sentir que as pessoas acolheram muito bem o meu primeiro single, o que me deu força e coragem para continuar a apostar na nossa música popular, mais concretamente no estilo que mais me identifico que é a morna.
Após o lançamento do álbum “Folclore” em 2017, no ano passado eu senti vontade de fazer alguma coisa. Eu e o meu agente pensamos muito no que poderia ser feito, e dai surgiu o projecto de regravar uma música muito conhecida e eternizada na voz do grande Ildo Lobo, uma composição de Manuel d’Novas de nome “Nôs Morna”.
Uma vez que a morna é candidata a Património Imaterial da Humanidade pela UNESCO, este tema, pela sua letra, pelo seu significado, vinha quase como que um hino a esta candidatura, então resolvemos avançar.
Após decidir-mos avançar, o meu agente disse-me que ia fazer o convite ao Tito Paris para gravar comigo este tema, o que achei que seria impossível ele aceitar, pois estamos a falar de uma pessoa de renome internacional e não iria se interessar por gravar uma música com uma pessoa que ainda agora começou neste mundo da música. Desde o primeiro momento não acreditei que isso seria possível.
O que é certo é que o Tito Paris aceitou e além do músico e cantor magnífico que o Tito é, tive a honra e o privilégio de conhecer a pessoa Tito, uma pessoa humilde e de um coração enorme.
A ele devo-lhe muitas lições de vida que me tem dado desde então, muitas partilhas de estórias e vivências que me têm servido para crescer enquanto pessoa e enquanto cantora.
Para mim foi uma bênção o Tito Paris ter cruzado o meu caminho. Por vezes, ainda penso que é não é real, mas felizmente é. Com ele, a música “Nôs Morna” ganhou outro brilho.
O “Talentu Strela” foi mais uma etapa no caminho. Foi mais uma oportunidade que tive de poder mostrar a minha voz. Foi importante porque era um programa que era transmitido na Televisão de Cabo Verde e assim as pessoas puderam conhecer melhor um pouco mais de mim.
Eu insiro-me no mercado daqueles que fazem o seu trabalho de uma forma muito profissional e com uma grande responsabilidade.
Sei o custo que o projeto “Cremilda Medina “ tem, pois não é só o álbum Folclore, mas sim todo o projeto que está traçado e orientado para que tudo siga o seu caminho. Não tem sido fácil, mas tem sido gratificante pois quando se faz um trabalho com profissionalismo e acima de tudo com muito amor, as coisas têm tudo para dar certo.
Cabo Verde tem muitos talentos musicais, por vezes julgo que falta apenas uma oportunidade para alguns. Não adianta teres uma voz bonita, é necessário ter também humildade e correr atrás das oportunidades e não ficar em casa à espera que elas venham ter contigo.
No geral, sinto-me muito acarinhada e posso dizer que sim, um pouco reconhecida, mas sei que ainda tenho muito que aprender e muito para dar.
O reconhecimento é tudo aquilo que os artistas sempre almejam e sonham, eu sinto- me muito feliz com o reconhecimento que vou tendo no meu percurso pois, como disse, é muito gratificante ver o nosso trabalho ser reconhecido.
As minhas influências e inspirações desde pequena sempre foram os intérpretes/cantores que eu mais ouvia na rádio, como a Cesária Évora, Ildo Lobo, Morgadinho, Tito Paris, Paulino Vieira, Bana, entre outros. A forma como interpretavam as composições, a entrega de cada um, fazia e faz com que ao ouvirmos as suas vozes nos transportemos para um outro lugar, um lugar sublime, calmo, sereno e ao mesmo tempo carregado de sentimento.
Hoje em dia continuam a ser os mesmos que me inspiram, aqueles que me despertaram o interesse e amor pela música popular de Cabo Verde. O meu sonho continua a ser o poder continuar o legado que eles construíram com a sua voz e humildade. Eles foram e são grandes embaixadores da música de Cabo Verde e grandes responsáveis por hoje em dia Cabo Verde ser mais conhecido em todo o mundo.
Fui nomeada três vezes, uma primeira vez em 2016 com o single “Raio de Sol” mas não venci, depois nomeada em 2017 e em 2018, os dois em que venci.
Curioso que das duas vezes que venci o premio World Music foram com composições do eterno Manuel d’Novas, em 2017 com uma coladeira e em 2018 com uma morna, os dois estilos musicais com que mais me identifico.
Confesso que este último teve um sentimento muito especial sendo que ganhei o prémio World Music com uma morna no ano em que Cabo Verde aguarda pela aprovação da UNESCO para Património Imaterial da Humanidade.
São sentimentos únicos quando ouvimos o nosso nome nestes eventos e ainda para mais quando somos reconhecidos, é fantástico, alimenta-nos a alma.
Estas vitórias são sempre muito importantes, são marcos que ficam na nossa história, sendo que a minha ainda agora começou, mas começar assim é uma alegria imensa, significa que estou no bom caminho.
Desde pequena que em casa dos meus pais ouvia fado, a Amália Rodrigues, o Carlos do Carmo, e eu adorava e hoje em dia, após perceber um pouco do Fado, dos sentimentos que transmite, representa imenso para mim.
Como prova do significado que o fado tem para mim, no meu álbum Folclore gravei um composto por José Eduardo Agualusa e Ricardo Cruz. Foi uma experiencia fantástica.
A Cremilda fora dos palcos é uma rapariga muito recatada, tímida que gosta de ficar no seu canto. Gosto de viajar e apanhar sol, faz-me muito bem para recarregar as energias, ficar em casa a ver filmes e séries de TV assim como estar com a família e amigos.
Como disse, o projeto Cremilda Medina vai continuar. Já estou a trabalhar no meu próximo álbum, que já tem nome, ao contrário de Folclore, que primeiro gravei o álbum e só depois veio o nome, este já tem nome e agora estou a trabalhar nas composições.
O tema “Nôs Morna” faz parte do próximo álbum, e é já um tema que mereceu o reconhecimento como “Best World Music”, o que significa que o álbum ainda nem saiu e já conta com um prémio internacional.
O próximo álbum será uma continuação de Folclore, com muitas mornas e coladeiras e, quem sabe, com alguns outros estilos musicais.
De mim podem esperar sempre muita humildade e profissionalismo assim como a continuidade da música popular de Cabo Verde, especialmente a nossa morna.
Relembramos-te que podes ouvir os nossos podcasts através da Apple Podcasts e Spotify e as entrevistas vídeo estão disponíveis no nosso canal de YouTube.
Para sugerir correções ou assuntos que gostarias de ler, ver ou ouvir na BANTUMEN, envia-nos um email para redacao@bantumen.com.
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