Globoplay estreia “Reencarne” com Welket Bungué, Isabél Zuaa e Taís Araújo

October 30, 2025
reencarne globoplay welket bungue isabel zuaa
Welket Bungué e Isabél Zuaa | DR

Partilhar

A Globoplay estreou recente “Reencarne”, a nova série original que vem a redefinir o lugar do terror no audiovisual brasileiro. Criada por Amanda Jordão, Elisio Lopes Jr., Flávia Lacerda, Juan Jullian e Igor Verde, e com direção artística de Bruno Safadi, a produção combina suspense policial, misticismo e drama existencial, desenhando um novo subgénero que a própria equipa apelidou de “terror sertanejo”, feito de luz, pó e silêncio, onde o medo vive sob o sol do interior de Goiás.

Ao longo de nove episódios, a série coloca lado a lado o humano e o espiritual, explorando os limites entre vida e morte, fé e ciência, culpa e redenção.

O ponto de partida é Túlio, interpretado por Welket Bungué, um ex-polícia que passa vinte anos na prisão acusado de assassinar o seu parceiro de trabalho, Caio (Pedro Caetano). Quando sai em liberdade, tenta reconstruir a vida, mas o passado regressa com força quando conhece Sandra (Julia Dalavia), uma jovem que acredita ser a reencarnação de Caio, o homem que ele supostamente matou.

Enquanto Túlio tenta lidar com o peso da culpa e com as memórias fragmentadas do crime, a inspetora Bárbara Lopes (Taís Araújo) investiga uma série de mortes que parecem seguir um padrão impossível de explicar. Racional e cética, Bárbara vê a sua conceção científica do mundo ruir à medida que o sobrenatural se insinua no quotidiano.

Taís Araújo no papel de Bárbara ©️ Estevam Avellar/Globo
Taís Araújo no papel de Bárbara ©️ Estevam Avellar/Globo

No mesmo universo, Dr. Feliciano (Enrique Diaz) ultrapassa todos os limites da ética médica numa tentativa desesperada de salvar a esposa, Cássia (Simone Spoladore), de uma doença degenerativa. Ajudado por Lúcia (Grace Passô), médium e sua aliada de longa data, Feliciano acredita poder transferir almas entre corpos, um experimento que mistura fé, ciência e desespero.

Entre esses enredos entrelaçados, o de Isadora, interpretada por Isabél Zuaa, funciona como elo invisível. Médica e ex-noiva de Túlio, é uma mulher dividida entre a razão e o inexplicável. O reencontro com o antigo amor obriga-a a revisitar feridas, crenças e memórias que julgava enterradas. Quando conhece Sandra, a jovem que acredita ser a alma reencarnada de Caio, Isadora confronta a própria fé e vê-se arrastada para um mundo onde o espiritual e o científico se confundem. “A minha personagem começa totalmente sóbria, científica, mas os factos e atravessamentos vão sendo cada vez mais evidentes, principalmente as coincidências e evidências de um passado íntimo que acaba por ser desvendado ao longo da trama”, explica Zuaa. “Para mim foi super orgânico esse caminho entre a razão e a fé, porque os acontecimentos eram bastante concretos, para Isadora, e não podiam ser coincidências. Quando a sua vida ficou em perigo, ela não teve escolha senão acreditar, ter fé nos seus afetos, mesmo que não concordasse. Sou uma pessoa de várias crenças expansivas e muita fé, por isso esse equilíbrio foi natural para mim.”

Isabél, atriz luso-angolana com raízes em Guiné-Bissau e Angola, é um dos nomes mais respeitados do cinema lusófono, traz para Reencarne a sua assinatura de intensidade e presença física, habitando o limiar entre o corpo e o mito. “Reencarne é bastante aliciante para uma artista que gosta de ser desafiada, como eu”, acrescenta. “A direção artística é do Bruno Safadi, com quem já tinha colaborado no filme Lilith, e o guião é de uma complexidade incrível, criando convenções próprias. A arte, para mim, tem essa abrangência, coragem e ousadia. A minha visão sobre espiritualidade é muito ampla, e esta série é muito diferente de tudo o que alguma vez já fiz.”

Em Welket Bungué, a série encontra o seu eixo emocional. O ator, nascido na Guiné-Bissau, criado no Brasil e radicado em Berlim, dá vida a um homem em busca de redenção. Formado em Teatro pela Escola Superior de Teatro e Cinema de Lisboa e membro da Academia Europeia de Cinema, Welket tem construído uma carreira marcada por personagens que exploram fronteiras geográficas, identitárias e espirituais.

A ligação do ator com a série vai além da interpretação e é o próprio a admitir que a mesma chegou num momento de viragem pessoal, marcado por um episódio que o obrigou a repensar a própria relação com a vida e com a arte.


Em entrevista à BANTUMEN, Bungué recorda o desaparecimento que viveu em 2023, no Rio de Janeiro, após ter sido vítima de uma substância colocada na bebida, acontecimento que o deixou em coma induzido durante 24 horas. “Quando despertei, percebi que tinha voltado à vida com outra consciência, com outra perceção do valor da existência e da minha função aqui. A partir daí tornei-me mais consciente do meu papel enquanto artista e contador de histórias”, explica, acrescentando que o episódio teve consequências diretas na concretização do projeto: “Na época, já me tinham informado que eu não poderia participar em Reencarne por razões burocráticas, mas esse acontecimento acabou por inverter a situação. O realizador percebeu que eu estava na cidade e o projeto retomou o rumo que deveria ter desde o início.”

A experiência moldou o seu entendimento sobre o personagem, que vê como "um homem que carrega a culpa e a necessidade de redenção. Sugeri que ele se entregou à polícia porque se sentia culpado, mesmo sem saber quem matou o companheiro. Essa auto-penitência é essencial para alguém que procura transitar para outro estado de compreensão do existir. Enquanto ele passava por isso, eu também atravessava o meu próprio processo.” Essa dimensão espiritual manifesta-se na relação do ator com Exu, entidade que acompanha o seu percurso e que, diz, o guiou também neste papel. “No dia do incidente, eu tinha orado a Exu, entidade que venero e a quem peço proteção. Quando voltei ao projeto, foi a ele que me agarrei. Pela sua energia e pluralidade, Exu tornou-se o arquétipo que me orientou neste desafio.”

Filmada no interior de Goiás, Reencarne mergulha num Brasil árido e conservador, onde a religiosidade popular convive com o medo e o desejo. “Acho bastante corajoso levar uma história interseccional para esse território”, observa. “A série desconstrói a hegemonia das questões de género e coloca corpos pretos, não normativos, no centro do desejo, da fé e do medo. É, de certa forma, um bang bang espírita.”

Ao lado de Isabél Zuaa, com quem tem trabalhado em diferentes contextos, Welket sublinha a continuidade de uma parceria assente na sensibilidade e na herança comum. “Trabalhar com a Isabél é sempre um enorme privilégio. Somos ambos descendentes de Guiné-Bissau e Angola, e o animismo, enquanto filosofia de vida e crença na interação com os que já partiram, está muito presente em nós. Isso permitiu que entrássemos nesta história de forma orgânica, entre o espiritual e o técnico.”

Para o ator, a obra é uma reflexão sobre as travessias humanas. “O cinema permite revisitar o que fizemos bem, o que fizemos menos bem e o que poderíamos ter mudado se tivéssemos a oportunidade de reviver. É disso que trata Reencarne: do que permanece quando tudo o resto se dissolve.”

Reencarne é uma produção de elenco, e a força da série está também na diversidade dos seus intérpretes. Para lá do terror, a obra assume-se como um um ensaio sobre culpa e recomeço, colocando em evidencia o que nos define: o corpo, a alma ou o que deixamos nos outros, onde o terror surge como reflexão sobre as fronteiras da fé e da ciência.

A presença de Welket Bungué e Isabél Zuaa posiciona Reencarne como uma das produções brasileiras mais relevantes do ano, não apenas pelo enredo e pela direção artística, mas pela integração de dois intérpretes que têm afirmado as suas carreiras entre a Europa, África e o Brasil, projetando o cinema lusófono no circuito internacional e ampliando a representação negra no audiovisual.

Relembramos-te que podes ouvir os nossos podcasts através da Apple Podcasts e Spotify e as entrevistas vídeo estão disponíveis no nosso canal de YouTube.

Para sugerir correções ou assuntos que gostarias de ler, ver ou ouvir na BANTUMEN, envia-nos um email para redacao@bantumen.com.

bantumen.com desenvolvido por Bondhabits. Agência de marketing digital e desenvolvimento de websites e desenvolvimento de apps mobile