Como Fly Skuad se tornou num dos maiores empreendedores sociais da lusofonia

Num mundo onde a influência digital se tornou uma das forças mais poderosas de mobilização social, emergem figuras que transcendem o entretenimento para se tornarem verdadeiros agentes de mudança. Além de ser um rapper, empreendedor, agitador cultural e influenciador digital, Fly Skuad tornou-se num agente de mudança social, cujo trabalho transcende as fronteiras de Angola, e que ecoa pelos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) e na diáspora.

A capacidade de Fly mobilizar audiências massivas através do “Fly Podcast” ultrapassa as fronteiras de Angola, sendo hoje um dos programas digitais lusófonos de maior audiência. Considerando todas as plataformas, estamos a falar de um alcance direto de aproximadamente 1,4 milhões de seguidores, com picos de audiência ao vivo que chegam aos 24 mil espectadores simultâneos e vídeos que atingem milhões de visualizações em poucas semanas. Num contexto digital que propicia o conteúdo irrelevante mas que é alvo de interesse pelas massas - logo, rentável - financeiramente -, Fly compreendeu que a sua influência, além de um ativo comercial, é também uma responsabilidade social, utilizando-a para mobilizar recursos em prol dos mais necessitados. 

Antes de abordar o presente, é precico recordar o passado e de onde vem a influência de Fly Skuad. Por volta de 2011, o então rapper demonstrou a sua capacidade de transformar ideias em movimentos culturais de impacto. Criou a "Reis do Rompimento Primeira Liga" (RRPL), que rapidamente evoluiu das ruas de Luanda para se tornar a principal liga de batalhas de rap da lusofonia. Além do entretenimento óbvio, a RRPL tornou-se numa empresa social que tirou jovens das ruas, ofereceu-lhes uma fonte de rendimento digna e revelou talentos como Mente Mágica, Paizão, Tanay Mc, e muitos outros. Com mais de uma década de existência a liga expandiu-se internacionalmente, estabelecendo intercâmbios com Portugal e Moçambique, e consolidou-se como um dos canais de YouTube com mais subscritores em Angola. Este projeto estabeleceu as bases da influência e credibilidade que Fly Skuad viria a canalizar, anos mais tarde, para as suas causas de solidariedade social.

A sua abordagem é particularmente eficaz porque combina entretenimento com consciência social, e cria um modelo onde a audiência não é apenas consumidora passiva de conteúdo, mas participante ativa em causas sociais. Cada episódio do seu podcast é uma oportunidade de sensibilização, cada história partilhada é uma chamada à ação, e cada doação angariada torna-se numa demonstração tangível do poder transformador da influência quando direcionada para o bem comum.

Angola é um país de contrastes. Apesar de registar uma recuperação económica significativa (de acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE), em 2024, o crescimento do PIB foi de 4,4%, o maior da última década), uma parte significativa da população continua a enfrentar a pobreza, o desemprego e a exclusão social. Como aponta um relatório da Voz da América, os desafios económicos e sociais de Angola em 2024 foram ainda maiores, com o desemprego e a pobreza a figurarem no topo das preocupações. A população jovem, que constitui a maioria do país, é particularmente afetada, com altas taxas de desemprego e subemprego, o que contribui para a marginalização social e o aumento da criminalidade. É neste cenário que as iniciativas da sociedade civil e de figuras públicas como Fly Skuad assumem uma importância crucial. 

A desconfiança em relação às instituições e a burocracia associada aos (parcos) canais de ajuda tradicionais criam um vácuo que é preenchido por ações mais diretas e transparentes. A abordagem de Fly Skuad, ao contornar intermediários e conectar diretamente doadores e beneficiários, responde a uma necessidade premente de confiança e eficácia. A divulgação do IBAN dos beneficiários não é só um ato de transparência, como também uma declaração política: a de que a ajuda pode e deve ser direta, pessoal e desprovida de agendas ocultas.

Em termos práticos e de transparência digital, Fly optou por agregar às campanhas de angariação o IBAN direto de cada beneficiário, o que exclui o pagamento de taxas e comissões, como o que acontece, por exemplo, em plataformas de crowdfunding. 

Só este ano, através da rubrica “SOS do Fly Podcast”, o empresário e artista conseguiu arrecadar 80 milhões de kwanzas (cerca de 80 mil euros), distribuídos entre diversos beneficiários em situações de vulnerabilidade. Entre os casos mais significativos destacam-se Mário, que recebeu 27 milhões de kwanzas, Vicentina com 16 milhões, Pequena Daiane com 12 milhões, e Pequeno Júnior com 11,4 milhões de kwanzas, entre outros. Estes valores, registados apenas entre janeiro e agosto de 2025. Fly revelou os números através de um post nas suas redes sociais, num exercício de transparência, mas também de prestação de contas à comunidade que confia nele para canalizar a sua generosidade coletiva.

O eco nos PALOP e na diáspora: um modelo de inspiração e possíveis alianças

O impacto do trabalho de Fly Skuad não se limita a Angola. A sua influência estende-se a toda a comunidade PALOP e, de forma particular, à diáspora angolana em Portugal. A partilha da mesma língua e de um património cultural comum cria uma ponte natural que facilita a disseminação de ideias e de exemplos. Para a diáspora, que muitas vezes se sente impotente perante os problemas do seu país de origem, a iniciativa de Fly Skuad oferece um canal de participação direta e tangível.

A comunidade angolana em Portugal, a segunda maior comunidade africana no país [4], mantém laços fortes com Angola. Muitos dos seus membros enviam remessas para as suas famílias e sentem uma responsabilidade partilhada pelo bem-estar do seu país. No entanto, a distância e a falta de canais de confiança podem ser obstáculos à sua contribuição. O modelo de Fly Skuad, ao garantir que a ajuda chega diretamente a quem precisa, sem desvios nem custos administrativos, remove estas barreiras e mobiliza a diáspora de uma forma sem precedentes.

O sucesso do "Fly Podcast" junto das comunidades PALOP e da diáspora demonstra a existência de um espaço mediático transnacional, onde se partilham preocupações, se debatem soluções e se celebram os sucessos. Fly Skuad, ao utilizar esta plataforma para promover as suas causas sociais, não está apenas a angariar fundos, mas também a construir uma comunidade global de solidariedade. A sua mensagem de esperança e de ação ressoa junto de todos aqueles que, apesar da distância, mantêm um forte vínculo emocional com a sua terra natal e desejam contribuir para o seu desenvolvimento.